Pedofilia: Do real para o virtual

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A notícia que segue nessa sexta-feira(15) no país todo relembra a chocante realidade dos crimes de pedofilia nas redes sociais, nos novos aplicativos tecnológicos e no mundo real.

Os pais tem que redobrar a atenção com os seus filhos, todos mantenham-se atentos, sempre!

Por Paulo César Ribeiro Martins, Sahar Juma Mahmud Mustafa Baja, Paulo César Ferreira

A pedofilia tem sido o crime, indiscutivelmente, mais comentado nos últimos tempos, em todas as nações, de forma que essa prática vem acontecendo e causando repulsa em toda a sociedade em razão dos prejuízos que causa às crianças e pré-adolescentes. Esse distúrbio é conhecido como parafilia, um transtorno da sexualidade humana que se caracteriza pelo caráter impulsivo, refletindo na necessidade imperiosa de repetição da experiência. Verifica-se que tanto homens como mulheres, das mais diversas classes sociais, podem possuir esse transtorno sexual conceituado no manual diagnóstico de transtornos mentais (DSM–IV, 1995, p.495) como:

“[…] fantasias, anseios sexuais intensos e sexualmente excitantes, envolvendo sofrimento ou humilhação com crianças ou pessoas sem o seu consentimento por um período mínimo de seis meses.”

Dessa forma, os criminosos que sofrem desse transtorno envolvem a criança em uma cadeia de sofrimento, humilhação e dor ao obter seu prazer sexual, causando traumas irreversíveis, já que a pedofilia, muitas vezes, é um processo lento e praticado por um período relativamente longo com a mesma vítima. Quanto à classificação de tal transtorno, o código internacional de doenças (CID-10) registra a seguinte definição:

“Uma preferência sexual por crianças, usualmente de idade pré-puberal ou no início da puberdade. Alguns pedófilos são atraídos apenas por meninas, outros apenas por meninos e outros ainda estão interessados em ambos os sexos. A pedofilia raramente é identificada em mulheres. […] Homens que molestam sexualmente seus próprios filhos pré-púberes, ocasionalmente seduzem outras crianças também, mas em qualquer caso seu comportamento é indicativo de pedofilia”. (1993, p.215).

Conforme se vê, a pedofilia é um transtorno que pode ocorrer em qualquer indivíduo, seja ele homem ou mulher, independente da classe social. Sabe-se que a pedofilia é raramente constatada em mulheres, no entanto, não se sabe se a incidência é menor que em homens, até porque as mulheres comumente não causam danos físicos e as vítimas, muitas vezes, recebem o abuso como carinhos ou aventuras secretas e não denunciam. Ainda, na década de 1960, Caprio e Brenner definem esse distúrbio de forma bem específica da seguinte forma:

“Pedofilia é o desvio do impulso sexual caracterizado pelo desejo compulsivo de, sexualmente, abordar ou atacar crianças. A palavra é de origem grega e significa “amor às crianças”. É delito sexual comum. Em alguns casos, o delinqüente apenas acaricia a criança, em outros, persuade-a a cometer o ato sexual; em casos extremados, o pedófilo inflige dano físico”. (1967, p.153).

Vê-se, então, que este transtorno é tratado como desvio sexual, o qual o indivíduo que o possui tem desejo libidinoso por crianças, no entanto, sua compulsão sexual nem sempre acaba com a conclusão do ato sexual, algumas vezes apenas acaricia a vítima. Em casos extremos, ocorre o dano físico, mas isso não é a pratica em todos os casos. Trindade e Breier (2007), ao elucidar as características dos pedófilos, descrevem o polimorfismo fenomenológico da pedofilia afirmando que:

“Pedófilos são predadores sexuais disfarçados de homens gentis, ou seja, lobos em pele de cordeiro. Eles têm o maior interesse em parecer normais e simpáticos e, então, se misturam ao contexto para evitarem suspeitas. Para terem sucesso na tarefa de aliciar crianças, os pedófilos apresentam-se como: charmosos, simpáticos, compreensivos, úteis, generosos, atenciosos”. (p.22).

Os pedófilos geralmente são aqueles em quem a criança confia e convive, e, ainda, são criativos e desenvolvem estratégias de atuação, apresentando-se sempre alegres e participativos. Assim, os indivíduos pedófilos, geralmente, escolhem uma profissão que possibilita o contato direto com crianças ou pré-adolescentes, estão sempre disponíveis para a vítima e, ao atender suas necessidades, acabam por ganhar sua confiança e, por isso, na maioria das vezes, os criminosos passam despercebidos pelos próprios pais. A pedofilia tem uma evolução crônica, com comportamentos que vão do despir as crianças, a observá-las, ao toque, ao sexo oral, à masturbação, até a penetração.

O criminoso, geralmente, aproveita a ausência dos pais e responsáveis para participar de atividades junto às crianças e pré-puberes. Assim, acaba sempre servindo de companhia e ingressando no ambiente familiar. Após conseguir a confiança da vítima, ela, muitas vezes, torna-se dependente ao ponto de ficar nas mãos do criminoso. O processo do criminoso é lento, procurando ficar sozinho com a vítima, envolvendo-a numa rede, deixando-a desprotegida e solitária. Para Trindade e Breier (2007, p.22) “o pedófilo constrói essa rede pacientemente, de maneira consciente e detalhada, fio após fio, de modo que a criança não percebe a situação em que está envolvida”.

Nesse contexto, Trindade e Breier (2007) citam quatro condições que precisam estar presentes para acontecer o abuso: 1. Motivação, que se caracteriza pelo desejo de abusar sexualmente de uma criança. 2. Inibição interna, que diz respeito à superação dos inibidores internos e implica em que o abusador sexual elabore a justificativa infundada de que o abuso não é prejudicial ou que se constitui de algo natural, dessa maneira, o abusador libera a sua motivação. 3. Inibição externa, que se refere à superação dos inibidores externos que impedem o abuso sexual, criando a oportunidade para que o abuso aconteça. 4. Resistência, que trata da superação das defesas da criança, deixando-a vulnerável ao abuso.

O pedófilo perturbado em seus desejos também pode recorrer a atos de violência de forma explícita contra sua vítima. Também, pode ser violento com aqueles que descobrem os fatos, interrompendo o silêncio imposto à criança. Observa-se que a pedofilia configura-se num crime gravíssimo, com o qual à sociedade depara-se com casos reais inacreditáveis, demonstrando que ninguém está livre de ser vítima dessa situação.

 

CASOS REAIS DE PEDOFILIA      

A mídia falada e escrita, nos últimos tempos, tem comentado bastante sobre pedofilia. Casos absurdos têm acontecido com relação a esse tipo de crime, pessoas famosas na sociedade brasileira têm estado em foco como vítimas, mas, também como acusados. Na data de 15 de maio de 2009, no programa Globo Repórter, diversas foram as reportagens com relação à pedofilia e abuso sexual infantil, incluindo o caso de uma nadadora conhecida pelo público, vítima de pedofilia.

A nadadora expõe sua intimidade, ao contar, aos 20 anos de idade, ter sido abusada sexualmente pelo seu próprio técnico, pessoa em que ela confiava, quando era uma criança com apenas 9 anos de idade. Nunca havia comentado nada na imprensa e agora comenta o caso, tendo coragem de expor sua mágoa guardada por tanto tempo.  No entanto, é impedida de processar a pessoa que lhe tirou a paz por tantos anos, pelo fato de ter conseguido se expressar apenas aos 20 anos. A lei é expressa ao dizer que o crime de abuso sexual deve ser denunciado em até 10 anos após o fato ocorrido, e, agora a nadadora está sendo processada por ter contado o ocorrido, apenas aos 20 anos, sendo que sofreu o abuso com 9 anos, totalizando assim, um tempo de 11 anos para a denúncia, conforme trechos da seguinte reportagem (GLOBO, 2010b, p.1):

“Joanna Maranhão: vítima no banco dos réus. Nadadora agora é processada pelo ex-técnico Eugênio Miranda, denunciado por ela como o homem que a agrediu sexualmente na infância. A atleta revela o medo que sente ao lembrar da violência que sofreu […] “Eu tinha medo de falar porque as nossas famílias eram muito próximas. Então, eu tinha medo que ninguém acreditasse em mim. Acho que empurrei isso para debaixo do tapete o máximo de tempo que pude. Mas chegou um momento em que não dava mais, quando eu atingi a maturidade”, conta Joanna. […] Uma dor que ainda pode ser mais forte. De acusadora, Joanna passou à acusada. […] E agora ele é quem está acusando Joanna. “Tive que olhar para o rosto dele de novo e escutar ele dizer que é inocente. Tive que escutar várias pessoas dizerem que eu estava mentindo.”

Pode-se verificar a tamanha dor da atleta ao guardar toda mágoa sentida desde seus 9 até os 20 anos de idade, sem conseguir expressar sua dor, pois a pessoa que a agrediu física e mentalmente era uma pessoa em quem confiava. Suas famílias se davam bem e agora, ao conseguir denunciar, é impedida de fazer com que ele pague pelo feito, tornando sua dor ainda maior. Hoje, a atleta sofre um processo por injúria, calúnia e difamação, piorando mais ainda sua dor e sofrimento. Por outro lado, está em trâmite no Senado um projeto de lei para alteração das regras quanto à prescrição dos crimes contra a sexualidade das crianças e tem como título “Lei Joanna Maranhão” conforme propõe o projeto:

“O PLS 234/09 modifica as regras relativas à prescrição de crimes cometidos contra crianças e adolescentes. De acordo com o projeto, o prazo prescricional para estes crimes só começa a contar quando o jovem completar 18 anos, salvo se a esse tempo já houver sido proposta a ação penal. A proposta foi batizada por Magno Malta de “Lei Joanna Maranhão”. (BRASIL, 2010c, p.1).

Conforme visto, o caso da nadadora que sofreu ao ter coragem de denunciar o abuso sofrido apenas 11 anos depois acabou sendo vítima de mais um golpe do destino, em que a lei fica do lado do acusado e não da vítima, tornando-a ré, fazendo então com que seu sofrimento torne-se maior e o sentimento de humilhação interminável. Haja vista, em função deste caso, o senado promove um projeto em que propõe a alteração dos prazos prescricionais nos crimes contra a criança e adolescente em matéria sexual, de acordo com o projeto o prazo iniciaria apenas quando a vítima completasse seus 18 anos, assim teria mais discernimento ao denunciar o acusado.

Na mesma série de reportagens exibidas na data do caso discorrido, para surpresa de muitos, aparece um ex- deputado que não é vítima e sim acusado. O ex-deputado convidou uma garota de 9 anos, que morava no interior, para morar com ele na cidade grande. Como é perfil dos pedófilos utilizar de linguagem de fácil entendimento a fim de atrair suas vitimas e ganhar sua confiança, o político obteve êxito em sua ação.

Dessa forma, vê-se que a pedofilia é realmente um crime que não tem distinção de classe social e a população jamais imaginaria que um deputado reconhecido iria ser um criminoso dessa estirpe. Ao abusar sexualmente da criança de 9 anos, ele torna-se um criminoso como qualquer outro, sem nenhuma prerrogativa do Estado, como descrito nos trechos da reportagem (GLOBO, 2010a, p.1):

“A história de abuso teria começado quando o ex-deputado Luiz Afonso Sefer levou a garota do interior, com 9 anos, para viver na casa dele em Belém. No ano passado, a menina contou tudo para a mãe de uma amiguinha, que imediatamente avisou às autoridades. […] O ex-deputado já prestou depoimento. Depois, renunciou, para não ser cassado. E agora espera pelo julgamento. […] Irmã Henriqueta sabe o que é ser ameaçada. Defender crianças e adolescentes, no Pará, tem feito ela, que faz parte da Comissão de Justiça e Paz da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), correr riscos todos os dias. […] “Por telefone, a pessoa pedia para que eu tomasse cuidado. O telefone pertence ao pai do ex-deputado Luiz Afonso Sefer. Isso está comprovado pela polícia. Eu cheguei a reconhecer a voz dele. Minha luta é incansável”, afirma a freira.”

Ao analisar as reportagens, pode-se observar que a pedofilia está em todos os lugares, que as pessoas famosas e conhecidas pela sociedade podem ser vítimas e outras podem ser criminosas. As pessoas mais improváveis podem ser criminosas sem que ninguém perceba e acabam por se desesperarem ao serem descobertas, fazendo ameaças, como foi o caso do ex-deputado. Por outro lado, podem se utilizar da legislação brasileira para se livrarem de condenações e se fazerem de vítimas, como o caso do treinador de natação, esquecendo que a lei pátria objetiva o melhor interesse da criança e do adolescente, bem como o princípio da dignidade humana.

 

PEDOFILIA NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

É de suma importância observar que a Constituição Federal de 1988, no seu artigo 227, refere-se ao princípio do melhor interesse da criança, especificando seus direitos relativos à dignidade da pessoa humana, sendo que a norma constitucional confere direitos protetivos e os regula para o melhor interesse da criança. Nesse intento, existe também o Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), o qual regulamenta todo um novo sistema para salvaguardar os infantes, caminhando junto com a Carta Magna e ficando conhecido como sistema da proteção integral, previsto em seu artigo 3º que diz:

“A criança e o adolescente gozam de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhes, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, a fim de lhes facultar o desenvolvimento físico, mental, moral, espiritual e social, em condições de liberdade e de dignidade”. (BRASIL, 2010b, p.1).

Constata-se, através das leis descritas, que a criança e o adolescente estão protegidos por normas fundamentais, tanto na Constituição Brasileira de 1988, quanto no Estatuto da Criança e do Adolescente, pois ambas as normativas têm intuito protetor e gozam de todos os direitos inerentes à dignidade da pessoa humana. Em relação ao crime de pedofilia, no ordenamento jurídico atual, não se tinha essa conduta tipificada e punível a criminosos que praticassem esse tipo de agressão à integridade da criança e do pré-adolescente, porém, havia projetos de leis para condenar esses crimes na medida em que ocorressem. Para essa questão, na data de 25 de novembro de 2008, foi sancionada a lei de n° 11.829 que alterou a lei n° 8.069 de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do Adolescente, para aprimorar o combate à produção, venda e distribuição de pornografia infantil, bem como criminalizar a aquisição e a posse de tal material e outras condutas relacionadas à pedofilia na internet. (BRASIL, 2010a).

Com a alteração do Estatuto da Criança e do Adolescente, esses crimes passaram a ser mais bem observados, inclusive com uma punição mais severa. O que antes não constava no ordenamento jurídico, atualmente consta. Mas, ainda há necessidade de aplicá-lo, conforme o descrito na nova redação da Lei 11.829 de 2008, que alterou os dispositivos legais 240 e 241, ainda acrescentando alguns artigos dos quais a pena aplicada para crimes de tal porte se tornam mais severas e vão de quatro a oito anos de reclusão e multa, alterações estas importantes na medida em que se deseja frear a ação desses criminosos. (BRASIL, 2010a).

Assim, vê-se que o ordenamento jurídico está tentando se aprimorar às condutas ocorridas na sociedade, bem como se adaptando para castigar criminosos de tal espécie que anteriormente não tinham a devida punição, incluindo os da era digital.

 

A PEDOFILIA COMO CRIME DIGITAL

Com o avanço tecnológico, diversos princípios constitucionais têm sido infringidos. A era digital ao mesmo tempo em que alavanca o desenvolvimento das comunicações e dos cidadãos em termos internacionais, pode vir de encontro aos princípios fundamentais da pessoa humana, no que se refere à liberdade, a privacidade, à intimidade e até mesmo à dignidade humana, como ocorre no crime cibernético relacionado a pedofilia.

A partir do final do século XX, a informática teve um desenvolvimento surpreendente e se tornou um meio de comunicação popular usado no mundo inteiro, ao mesmo tempo em que se convive com a problemática atual dos crimes cibernéticos e o avanço com que vêm se popularizando. Nesse contexto, faz sentido observar a era digital ao que diz respeito à criminalidade na informática.

No Brasil e no mundo, é crescente o número da criminalidade na área digital. Esses crimes vêm se popularizando na medida em que a rede se expande e se torna de fácil acesso para todas as pessoas, inclusive para crianças e adolescentes. Nesse sentido, o crime em foco, nos últimos tempos, tem sido a pedofilia, principalmente com o avanço tecnológico e a popularização mundial da internet. Dessa maneira, os pedófilos aproveitam-se, criando perfis falsos e utilizando-se de linguagem de fácil entendimento, para conseguirem a confiança das crianças e pré-adolescentes. A respeito dessa ideia, explica Fonseca (2001, p. 12) :

O abuso sexual de crianças, a sua utilização com fins sexuais, por seu turno, surge não apenas no seio do agrupamento familiar (incesto v.g). A divulgação de pornografia infantil, p.ex., o apelo publicitário de cunho sexual, são formas de agressão à criança, onde precisamos de atenção, orientação e, se necessário, punição exemplar.

Nesse intento, verifica-se que a utilização e a divulgação de pornografia infantil merece uma punição severa. A publicidade, com a sexualidade infantil, é uma agressão psíquica, sendo necessária uma atenção especial a esses casos, agora tipificado mais severamente no ordenamento jurídico brasileiro, já que a internet é de perto o meio mais fácil da ação criminosa contra crianças e pré-púberes.

Essa conduta delituosa não tem apenas o papel de satisfazer pessoas doentes que se sentem compelidas a abusar de crianças e pré-adolescentes, que ainda não têm a maturidade suficiente para discernir sobre seus atos, sobretudo ao que diz respeito à sexualidade. Também, tem o intuito de gerar lucros, o que estimula as redes de pedofilia a proliferar através da indução da pornografia infantil.

A internet é atualmente o maior e mais rápido meio de comunicação mundial, nela estão conectados milhões de pessoas a todo instante. Através da internet, a população tem acesso a um conhecimento rápido que nunca imaginou ter.  Por outro lado, os dados que circulam nela podem ser vistos por todos que tiverem acesso à rede. Dessa maneira, o avanço cibernético não traz apenas benefícios, consigo surgem também crimes e criminosos digitais, os quais estão aumentando proporcionalmente por todo o mundo, infringindo os princípios constitucionais.

Os princípios constitucionais são aqueles que guardam os valores da norma jurídica e estão descritos na Constituição Brasileira de 1988 (BRASIL, 2008), consagrados em seus artigos primeiro e quinto. Estes, têm assegurado no nosso ordenamento jurídico a proteção aos direitos fundamentais do ser humano, bem como os direitos sociais descritos na Carta Magna, visto que são essenciais para a vida em sociedade. Percebe-se que, ao infringir quaisquer dos princípios constitucionais, que representam direitos fundamentais e sociais, tem-se um ato ilícito que atenta contra a Lei Maior.  Aí, destacam-se os princípios infringidos contra a dignidade da pessoa humana, a igualdade, a privacidade e a intimidade, que acabam por ser afetados com a era digital pelo livre acesso na rede por milhões de pessoas.

Em primeiro lugar, destaca-se o princípio da dignidade da pessoa humana. Observa-se que a internet acaba por expor as pessoas de maneira que geram consequencias jurídicas no que diz respeito aos valores morais e materiais ao terem suas vidas vasculhadas por pessoas do mundo todo com acesso à rede, dessa forma, tem-se um dos princípios fundamentais infringidos. Nesse sentido, Moraes (2007, p.47) conceitua a dignidade humana da seguinte forma:

“A dignidade é um valor espiritual e moral inerente a pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos”.

Nesse contexto, a dignidade da pessoa humana tem um valor inestimável, pois a moral e a vida em si têm que ser respeitadas e ter um mínimo de limitações no âmbito de seus direitos fundamentais, não podendo ter seus direitos minimizados em função da vulnerabilidade a que se expõe na era digital. Verifica-se, também, a relevância auferida a esse princípio, o qual chega a ser nominado como um princípio geral do Direito, pois o direito à vida privada, à intimidade, à honra e à imagem, dentre outros, aparece como consequência imediata da consagração da dignidade da pessoa humana.

No tocante aos acessos diários a internet, como as redes de amigos, acabam por ocasionar uma autoexposição e é justamente aí que reside a possibilidade da invasão de privacidade e a falta de respeito ao direito à intimidade. Ao criar perfis na internet, a pessoa tem sua privacidade afetada de forma que qualquer pessoa no mundo todo terá acesso aos dados disponíveis pela mesma, bem como sua intimidade exposta e, com isso, poderá gerar consequências para sua imagem, acarretando também a minimização de sua dignidade. Ocorre, assim, a infração por si só dos princípios da invasão da privacidade e da intimidade, pelo fato de informações alheias estarem sendo acessadas por milhares de pessoas.

Assim, alguns indivíduos de má índole, como os criminosos de plantão, utilizam-se dos dados disponíveis para denegrir e explorar crianças e pré-adolescentes cometendo infrações no que diz respeito aos princípios constitucionais. Nesse sentido, temos exemplos de investigações que tiveram sucesso no combate ao crime de pedofilia, que teve seu início na rede mundial de computadores através da invasão de privacidade e intimidade.

 

INVESTIGAÇÕES E OPERAÇÕES CONTRA OS CRIMES CIBERNÉTICOS

Os avanços tecnológicos, o surgimento das câmeras digitais, aparelhos celulares com câmeras incorporadas e a popularização da internet impulsionaram a prática dos crimes cibernéticos que hoje atingem dimensões significativas no mundo todo. Com isso, os crimes envolvendo pedofilia são praticados com maior facilidade na medida em que a tecnologia avança. No entanto, da mesma forma que a internet facilita esta prática, os crimes cibernéticos são facilmente rastreados, tendo em vista que dificilmente os criminosos não deixam rastros. Cada computador utilizado possui um número identificador, pelo qual se pode descobrir onde está sendo utilizado e o que foi feito através daquela máquina.

Nesse contexto, em países como os Estados Unidos são feitas diversas operações de investigação a redes de pedofilia. Fontenelle (2010) cita três casos: Cathedral, Wonderworld e Tiny American Gilrs.

O caso Cathedral foi uma operação realizada pela polícia americana que teve início na Califórnia (Estados Unidos). Essa operação iniciou-se através de uma investigação isolada de abuso sexual e, assim, descobriram-se diversos envolvidos em uma rede pedófilica.

Da mesma forma, após o caso Cathedral, ocorreu o caso Wonderworld, também conhecido como mundo maravilhoso, no qual foram identificados no sistema de informática do abusador outros sites de clubes de pedófilos. A rede era organizada através de processos hierárquicos de administração. Através dessa operação de investigação, constatou-se que o acesso à organização era altamente restrito, com inúmeros códigos para o ingresso na rede.

Por fim, o caso mais marcante foi o Tiny American Gilrs (pequenas meninas americanas), envolvendo uma coleção de fotos de poses pornográficas de meninas nuas entre 10 e 12 anos de idade. A produção fotográfica era a maior peculiaridade e, nesses casos, as fotos focavam a genitália das pré-adolescentes.

Visto que a divulgação do material pornográfico pela Internet está na atualidade relacionado ao avanço da própria tecnologia, a internet tornou-se a principal arma dos criminosos, como vimos nos três casos anteriores. É um canal de comunicação, em que todas as pessoas que possuem acesso podem, por meio de redes virtuais, comunicarem-se, trocarem e-mail e se conhecerem em salas de bate-papo. A internet facilita, ainda, a divulgação em grande escala, dos materiais pornográficos envolvendo crianças e também adolescentes, tanto em países desenvolvidos como em desenvolvidos e esses crimes são de total crueldade contra o ser humano e não depende de raça, riqueza ou pobreza. Qualquer indivíduo pode possuir esse transtorno, basta sentir desejo sexual por crianças e pré-adolescentes e fantasiar os seus anseios.

No Brasil, e em muitos países tem sido crescente o número de casos de pedofilia no mundo virtual. Com a tecnologia avançada e a facilidade com que crianças e pré-púberes têm em sua residência um computador com webcam e internet à sua disposição por 24 horas, a ação dos criminosos torna-se rápida e fácil. Com computadores conectados no mundo todo, interligam-se entre eles e entre as crianças e pré-adolescentes em redes de amigos, facilitando para os pedófilos usarem de artimanhas para chamarem a atenção dos menores, na forma em que criam perfis falsos, falam em linguagem de fácil compreensão e conseguem ganhar a atenção de suas vítimas vulneráveis.

Assim, torna-se imprescindível que os pais e responsáveis fiscalizem por onde seus filhos navegam na internet. Sabe-se que muitas crianças, hoje em dia, têm poucos limites e vulnerabilidades para cair em armações perigosas, muitas vezes, por acharem que não são mais crianças e que podem fazer o que quiserem. Dessa maneira, tornam-se vítimas desse tipo de criminoso que se aproveita das crianças para fazer pornografia infantil e gerar em cima delas milhões em dinheiro. Por estas questões, entram em ação os investigadores no mundo todo, que estão sempre no rastro desse tipo de crime, pois não é apenas um pedófilo que pratica tal crime e sim vários, até milhares, em todo o mundo, pois eles tornam-se organizados entre si e criam redes de pedofilia para se comunicarem e se satisfazerem.

Com o mesmo avanço tecnológico, que facilita aos criminosos a prática de crimes de pedofilia pela internet, os investigadores também têm a internet como arma no mundo todo. Os agentes investigam as redes de pedofilia em todo o mundo e apresentam algumas operações que obtiveram sucesso, como a Operação Anjo da Guarda que ocorreu no Brasil no ano de 2005, onde houve busca e apreensão em diversas cidades do país. Esta investigação iniciou de acordo com uma denúncia que veio da Espanha, de que brasileiros estariam trocando fotos de pedofilia por um site espanhol. Alguns brasileiros chegavam a pagar para acessar o chat e a Polícia Federal suspeitou que 104 pessoas no Brasil acessavam  sites virtuais de pedofilia na internet. (SAFERNET, 2010).

Como se vê, os países interligam-se e participam conjuntamente nas investigações de redes de pedofilia, as quais têm um crescimento absurdo ano a ano podendo-se verificar este crescimento na reportagem realizada pela rede globo recentemente, sobre um relatório apresentado por um site italiano, o qual comenta o seguinte (GLOBO, 2010c p. 1):

“A associação italiana Telefono Arcobaleno, destinada à luta contra a pedofilia na internet e à assistência a crianças vítimas de abusos, denuncia em relatório anual que este crime na rede cresceu 149% desde 2003, mas, em alguns países, como o Brasil, o número de usuários desse material caiu. Sobre o Brasil, a associação indicou no relatório que o número de usuários que faz uso de material de pedofilia caiu 22% de 2003 a 2008. Só em 2008, a associação realizou 42.396 denúncias devido ao material de pedofilia presente na rede perante as autoridades de 45 países e os provedores de internet. Segundo o relatório, os países com mais denúncias são Alemanha (26.191), Holanda (5.256) e Estados Unidos (3.611). Por zonas, a Europa é a que registra mais casos de pedofilia, com 86,6% das denúncias e com um aumento de 406% na quantidade de material de pedofilia desde 2003, na frente da América do Norte, com 10,8% das denúncias.”

A pesquisa feita pela associação italiana, que está no combate a pedofilia no mundo todo, mostra dados impressionantes dos países em que o crime tem um aumento significativo, apontando o continente Europeu com maior índice de pedofilia frente à América. Essa associação tem por fim o combate ao crime e assistência às vítimas de abuso, tornando as denúncias mais fáceis de serem encontradas e verificadas para que sejam combatidas as redes de pedofilia que crescem absurdamente, juntamente com o crescimento do crime as investigações avançam e acabam por ajudar no combate.

Assim, verifica-se que, mesmo com o crescimento nas investigações e o sucesso obtido com as operações mundiais no rastro desses criminosos, ainda é preciso combater a pedofilia e tentar parar esses criminosos para que crianças e adolescentes não tenham que pagar um preço caro pelo acesso à tecnologia, pois os danos emocionais podem ser devastadores para o desenvolvimento dos jovens. A sociedade depara-se com crianças e pré-adolescentes que avançam junto com a tecnologia, acreditando ter necessidade de possuir todos os meios possíveis de conexão, mas, nessa rede, sempre podem surgir os perigos cibernéticos, como pedófilos aproveitando-se da tecnologia. A internet pode sim ser utilizada por eles, mas o avanço tecnológico e a movimentação financeira são tão grandes que a dificuldade em acompanhar tem sido preocupante para toda a sociedade, em razão da mercê tecnológica que as pessoas ficam no mundo cibernético.

Sendo assim, sabe-se que a pornografia infantil ainda está longe de ser totalmente desvendada, mas se a população se cientificar do que está ocorrendo e se prontificar a combatê-la, diminuirá o lucro desses criminosos e a ação dos mesmos sobre crianças e pré-adolescentes.

 

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Por fim, observa-se que a popularização da internet e a era digital trazem diversos benefícios à sociedade, outrossim, trazem consigo a ação criminosa em uma era em que a tecnologia e o respeito aos princípios constitucionais se esforçam para andarem de mãos dadas. Parece não haver uma razoabilidade entre alguns membros da sociedade atual e a era digital, que ao possuirem um acesso que facilita em muito a comunicação e os serviços para o bem da humanidade, simultaneamente se interligam para cometerem crimes cibernéticos, desrespeitando os princípios fundamentais que regem a vida em sociedade.

 

Fonte: www.ambito-juridico.com.br


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